domingo, 2 de março de 2008

Repetição insignificante

Rubrosuave, malteamargo. Uma noite, uma lua, várias estrelas, uma estrela. Estava frio, mas não muito. Em cinco, caminhamos até a praça. Meio caminho até o cemitério. Tinha esperanças? Não, eram só tolices. Mas como sempre, deixo-me levar. Não me recordo de uma vez que tenha resistido à tentações. Seria esse um sinal de fraqueza de caráter? Um pecado? Na metade do caminho, resolvemos voltar. Ébrios, agora. Os outros, ao menos. Eu estou mais sóbrio do que gostaria. Sempre.

No caminho, penso sobre o motivo de minha tolice. Eu já tenho o espírito curtido pela vida, não deveria ser assim.

'A lua está bonita. Mas as luzes da cidade matam a noite.'

Gosto do som. Frases poéticas; mas mais do que um sentido, palavras são sons: o modo como sobem e descem seus tons, acariciando os ouvidos com ternura, causam-me prazer. Sentamos-nos, a pequena não está bem. Mais por suas agonias do que pelo vinho. Eu sei como é, eu digo. E sei mesmo. Quantas vezes já não me encotrei assim, abandonando a mim mesmo enquanto por dentro morria em nome de outra pessoa? Um mártir, mas nunca um jesuíta. Importar-se é sofrer. Ela vomita. Logo, o outro também.

Sinto-me responsável. Eu sou o mais velho, deveria ter tomado conta deles. Os corações que quebrei, as vezes que neguei ajuda, as vezes que fui fraco. Agora, mais uma culpa para juntar-se a essa galeria.

Para casa: entramos todos em meu carro, e a jornada é curta. Penso no que achava que devia ter feito - como seria melhor ter uma decepção à não ter feito nada. Haveria ainda tempo? Sempre há tempo na vida, dizia um poeta. Ou seria o povo? Não me recordo. De qualquer modo, não existe poeta maior do que o povo. Folkgeist.

Sem palavras - são insignificantes, apesar dos sons - tento ser o homem que não fui. Sem palavras - são insignificantes quando se quer realmente dizer algo - sou lembrado do motivo de meus medos.

Envio: a vida inteira, uma repetição insignificante.

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